Cartas de amor
Isabel sabia da existência dele. Nada mais que um gesto singular de olhar e tocar de leve sua mão a cada vez que lhe entregava as cartas vindas pelo correio. Foram anos de 'OI! tem cartas para você!" e de sorrisos cúmplices quando os envelopes verdes, amarelos, azuis e efeitados chegavam aos montes. Certo dia, não resisitu e disse: "você foi quem mais recebeu cartas neste ano! Até senti ciumes, pode?!" Sorrimos e ele me deu um abraço longo.
Gás da paixão
Toda manhã de segunda-feira, passava pelo posto e ele limpava os pára-brisas, enchia o tanque e dizia: "Bom dia! tudo bem?" Foram dois anos, naquela Brasilia enigmática e esotérica, entre a UnB e o parque da Água Mineral. Fosse como fosse, me via, deixava o outro freguês e me atendia. Sorria. Certa feita disse baixinho: "Fico feliz em te ver." - Eu tambem, respondi. De outra vez: "Me preocupei. Há duas semanas não aparecia!". No dia da defesa da minha dissertação, feliz, passei pelo posto para agradecer-lhe toda a atenção daqueles anos. Parei. Olhei. Esperei. Nada. De repente um senhor, com o ar muito grave disse: "Ele se chama Duilio. Foi embora de volta para o nordeste e pediu que lhe dissesse...[fez uma pose solene, emperdigou-se] e falou: "Nunca soube seu nome, mas te amei assim mesmo e amarei onde quer que eu for."
Choramos eu e 'seu' João. Sabíamos o que significavam aquelas palavras.
Retrato partido
Desde muito cuido para que as fotos sejam registros do acontecimento - sejam elas paisagens – rurais e urbanas; sejam pessoas desconhecidas, amigos e parentes em festas, e até aquelas fotos que aparentemente deram errado – uma lua lá longe num fundo totalmente escuro, ou uma sombra do objeto a ser fotografado.
Desde muito cuido para que as fotos sejam registros do acontecimento - sejam elas paisagens – rurais e urbanas; sejam pessoas desconhecidas, amigos e parentes em festas, e até aquelas fotos que aparentemente deram errado – uma lua lá longe num fundo totalmente escuro, ou uma sombra do objeto a ser fotografado.
Sempre defendi que jamais se recortem as fotografias. Mesmo as atuais digitalizadas. Nada de reeditar uma foto, de mudar a luz, retocar as cores, aprofundar o campo.
Por isso, quando me vi diante da nossa foto em que nossos sorrisos estampam uma imensa alegria, compreendi o que significavam as tantas fotos que amigas – ainda na adolescência, para espanto meu! - tesouravam o rosto e o corpo do amado, depois de um final de namoro; ou a tia mais velha retirava com fúria a presença de um membro da família que a partir daquele dia passava a ser persona non grata! por qualquer motivo de finanças desviadas.
Para meu espanto, agora na maturidade! eu tinha diante de mim a nossa foto feliz e com o mouse eu roia, como um rato, o queijo. Ou seja, consumida pela tristeza, apagava devagar a presença de você na foto–testemunho de um dia especial no qual compreendi, ao mesmo tempo, que a impossibilidade de tê-lo assim tão meu tornara-se maior que a felicidade em vê-lo tão poucas vezes assim tão próximo. Foi aí que ao ver o retrato partido em dois – você de um lado, separado de mim, sorrindo para mim e eu na mesma pose mas sem tocá-lo, sem sentir seu suor, sem provar dos seus beijos, distante de seu calor - foi nessa hora mesma que decidi separar-me de fato e não da foto.
Ainda bem que o mundo digitalizado me permitiu juntar nós dois na foto, para deixar registrado o acontecimento do dia feliz, guardando a partir de agora em um arquivo qualquer dos meus documentos, como que escondendo um segredo jamais revelado. Porém, mesmo ganhando a minha liberdade para além da fotografia, ali está o nosso sorriso de felicidade momentânea que durante anos permitiu sonhos e trouxe alegria para o meu coração partido – uma síndrome muito comum que acomete pessoas que acreditam no amor.
Por isso, quando me vi diante da nossa foto em que nossos sorrisos estampam uma imensa alegria, compreendi o que significavam as tantas fotos que amigas – ainda na adolescência, para espanto meu! - tesouravam o rosto e o corpo do amado, depois de um final de namoro; ou a tia mais velha retirava com fúria a presença de um membro da família que a partir daquele dia passava a ser persona non grata! por qualquer motivo de finanças desviadas.
Para meu espanto, agora na maturidade! eu tinha diante de mim a nossa foto feliz e com o mouse eu roia, como um rato, o queijo. Ou seja, consumida pela tristeza, apagava devagar a presença de você na foto–testemunho de um dia especial no qual compreendi, ao mesmo tempo, que a impossibilidade de tê-lo assim tão meu tornara-se maior que a felicidade em vê-lo tão poucas vezes assim tão próximo. Foi aí que ao ver o retrato partido em dois – você de um lado, separado de mim, sorrindo para mim e eu na mesma pose mas sem tocá-lo, sem sentir seu suor, sem provar dos seus beijos, distante de seu calor - foi nessa hora mesma que decidi separar-me de fato e não da foto.
Ainda bem que o mundo digitalizado me permitiu juntar nós dois na foto, para deixar registrado o acontecimento do dia feliz, guardando a partir de agora em um arquivo qualquer dos meus documentos, como que escondendo um segredo jamais revelado. Porém, mesmo ganhando a minha liberdade para além da fotografia, ali está o nosso sorriso de felicidade momentânea que durante anos permitiu sonhos e trouxe alegria para o meu coração partido – uma síndrome muito comum que acomete pessoas que acreditam no amor.
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